terça-feira, 5 de outubro de 2010

DESABAFO DE UMA JECA

     
      Hoje acordei com minha irmã me chamando para assistir algo parecido com o antigo “Som Brasil”, mas apresentado por Geraldo Boldrin. Fui convocada a relembrar as manhãs de domingo de tempos passados, quando meu avô nos mostrava o som do nosso país: Noel Rosa, Lamartine Babo, Dolores Duran, Almir Sater etc.
      Relembrando nosso avô, ela me perguntou “O que vovô diria se visse Itaocara hoje?”. Não precisei pensar muito, tinha a resposta na ponta da língua, disse-lhe “Ele nos perguntaria: Para onde foi a beleza?”.
      Começamos a indagar porque a raiva enlouquecida contra o verde. A grama das praças foi gradativamente ao longo dos anos trocada pelo concreto. A maioria das árvores foi arrancada, já não acordamos ao som dos passarinhos.
      Os monumentos desmoronam, lembramos o “Moisés”, interditado, a ponto de cair, como outrora lá brincávamos, foi lá que descobri que tenho medo de altura aos oito anos de idade. A piscina pública da primeira metade do século XX, afogou-se em toneladas de terra e concreto, dando lugar a um palco com cores vibrantes. As cores da cidade são fortes, quase uma violência contra o bom gosto. Ao invés de darem uma sensação de relaxamento como antes, agora expressam inquietude.
      Já perdemos tanto, nas fotos do casamento de nossos pais, havia um lindo coreto, que fora substituído e sequer chegamos a conhecê-lo. Não tenho filhos, mas se os tivesse, não poderia levá-los para conhecer a “Diana Caçadora”, o aquário com o peixe elétrico, o palco subterrâneo que pulávamos de prismas a cilindros coloridos até chegar à parte mais baixa, a estátua do “Frei Tomás” a quem pedíamos bênção, o museu que ficava onde hoje é a Secretaria de Educação, sobrou apenas a fonte do lado de fora e, destruíram a fonte do menininho fazendo xixi em frente ao hospital, foi assim que vi o primeiro homem nu.
      Por que tanta destruição? Onde anda nossa memória? Maria Rita será esquecida, e depois também o Toninho quando partir? Tudo isso em nome de um falso progresso, de uma arte nada moderna, de uma forma tão equivocada de ver a vida. Será que somente a gente tem saudade. Meu avô se foi há muito tempo, meu pai também, um dia serei eu a partir, e quem será Itaocara? Uma cidade sem memória, sem história, perdida para sempre.
      Uma nova cidade de concreto e pedra, moderna, cinza de progresso, quente, não pela emoção, mas pelas altas temperaturas, afinal são poucas árvores e nenhuma grama. E tudo novo, os monumentos, os prédios, as ruas, esquinas e calçadas. Talvez até o rio esteja em outro lugar, transportado por alguma nova tecnologia.
      Desaparecerá por completo o chão que um dia pisei e a beleza que retive. Apenas restarão algumas fotos e imagens na lembrança daqueles que apreciam o que é realmente imperceptível ao olhar da maioria apressada na busca pelo poder.



5 comentários:

  1. Memória: faculdade pela qual o espírito conserva ideias ou imagens, ou as readquire sem grande esforço. Lembranças. Realmente tudo ficará na lembrança se não for promovido o resgate de outrora. Infelizmente o concreto quente e feio se transmutará em falsa beleza. Uma pena! Amei viajar em tua indignação e no teu retrocesso: que para mim fora maravilhoso retornar à terra natal.

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  2. ROSIVAR; GOSTEI MUITO DESSAS SUAS REMINISCÊNCIAS... VAMOS PUBLICA=LAS?
    Lembrei-me de tanta coisa... que bem poderia ser uma nova tomada e depois mais outra.... para formação de um painel de memória dessa Itaocara...
    Mas fiquei curioso quanto às suas duas ilustrações! A 1º (Cidade) não faria confusão com entre o texto real e o pictórico da bela ilustração? Onde? Parece cidade mineira século XVII, contrastando com a modernidade da nº 2, também, onde? Dê um (flash" para seu tio.
    Bjão. Kleber

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  3. Nossa Dibá, se superou nesse texto. Lembrei-me de todos os monumentos e praças que mencionou, inclusive do sino que ficava bem perto da Diana Caçadora. Felizes de nós que conhecemos essa Itaocara!!!
    Bjs

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  4. Tio,
    A 1ª ilustração é de uma cidade mineira, onde ainda se valorizam a história e as memórias, pena que aqui seja tão diferente!
    A 2ª, é apenas um conceito que retrata a frieza para qual estamos migrando.
    Lindas imagens de artistas da internet!

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  5. No Brasil quando se tomba um patrimonio para preserva-lo para o futuro , tudo é feito ao pé da letra. Tombam e levam para a lixeira mesmo tombado, é literalmente derrubar e varrer da face da terra.
    O mesmo aconteceu em friburgo.
    Primo Ri

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