domingo, 21 de fevereiro de 2010

VALÃO DA ONÇA - Prólogo

A cidadezinha chama-se Valão da Onça, não que haja alguma onça, é que tudo na cidade é bem diferente, as ruas não são calçadas, não há carros a não ser a velha Cantareira do Seu Adalto, as casas são todas de tábua corrida e têm cheiro de passado, os habitantes são gente hospitaleira, a igreja fica na praça do coreto mas não funciona por falta de padre.
Numa das casas vive uma família composta de cinco pessoas: o pai, um homem de caráter, do tipo que impõe respeito não pelo uso da força mas pela firmeza do olhar; a mãe, uma dessas senhoras bravas que faz uso freqüente da varinha de goiaba; a filha, uma garota magrinha de cabelos escorridos que é muito frágil, do tipo que nem consegue subir em árvore; o filho mais velho é um gordinho atrevido que vive aprontando por toda a parte e o menorzinho é mesmo muito engraçado, pronuncia todas as palavras erradas e segue literalmente as ordens do irmão. Já ia me esquecendo, também faz parte da família o Dunga, um bêbado muito gente fina que toma conta dos meninos.
Outro fato interessante é que Dona Candinha, uma beata solteirona que está sempre bem informada de tudo que acontece no lugarejo, resolveu escrever ao bispo para pedir que este a ordene padre.
Isso causou um alvoroço na cidade e todos esperam ansiosos a resposta do bispo. Já fazem oito meses e até hoje nada, Dona Candinha anda dizendo que vai escrever agora é para o papa, e este a ordenará padre da Matriz de Santo Antônio.
Vive também na cidade o Clécio, um rapaz muito namorador que é vendedor junto com Seu Pernambuco. O Clécio se mete em confusão devido ao seu jeito lânguido, anda impecável e traz sempre no bolso um par de alianças extras que ele explica dizendo “A gente nunca sabe a hora certa de colocar uma aliança no dedo, por isso fico sempre preparado”. As más línguas dizem que só de noiva tem três, fora as outras namoradas.
O cemitério da cidade é temido por todos. Lá se ouvem barulhos estranhos, vêm-se vultos caminhando entre os túmulos e o cheiro agradável de rosas frescas sem que se possa notar rosa alguma. Nas noites de lua cheia gritos alucinantes ecoam dos túmulos e ninguém ousa passar nem na rua onde fica localizado.
Seu Pernambuco é um nordestino camarada, que chegou há pouco tempo na cidade. Logo fez amizade com todo mundo e se tornou sócio de Clécio no negócio de venda de baterias para rádio. O único problema é que Seu Pernambuco é totalmente atrapalhado e por isso vive se metendo em confusão. Recentemente ele batizou junto com Yeda, a filha caçula de Dona Mulata.
Dona Mulata é casada com Seu Raimundo, o dono da padaria, ela é uma senhora muito nervosa, dizem que é problema de pressão, mas alguns acham que ela não vai viver muito tempo pois o coração dela bate muito fraco. Yeda é a sobrinha de Dona Mulata, os pais dela morreram há muitos anos e desde muito pequena ela mora com eles.
Temido por todos é o moleque Eduardo, filho do Seu Dadá dono do mercado. Ele é mesmo impossível, espanca cachorro, dá nó nas tranças das meninas, quebra vidraças, rouba fruta do quintal dos vizinhos, esconde os cacetes dos fregueses do mercado. Cacete é um pedaço de pau, tipo cabo de vassoura, que o pessoal da roça usa pra se defender ao passar em estradas desertas. Não que haja ladrão, mas é que a gente da roça é muito desconfiada.
Também mora na cidade o escrivão do cartório, Seu Adalto, que vive com sua mulher Dona Cidinha e seus filhos. A paixão de seu Adalto é mesmo a criação de gansos. Os gansos de Seu Adalto são muito bravos e ficam soltos no pomar. Pegar frutas lá, nem pensar!

Um comentário:

  1. Amei o seu blog, prima!
    Viajei lendo suas crônicas.
    Muita saudade dos meus tios, dos meus pais,enfim de todos vcs.
    Coloquei uma foto dos meus velhos. beijos.

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