Contos, crônicas, relatos e opiniões...
Aqui é o espaço onde mostro minha essência!
A escritora se confunde com a mulher, externando todas as inquietações da alma de ambas...
Hoje fui visitar uma senhorinha que perdeu o marido recentemente. Ela na cadeira de rodas se recuperando também de uma operação no fêmur, estava bastante triste, reclamando a falta do marido que partira. Minha tia a consolava dizendo que ela era uma mulher de sorte, por ter ficado casada por tanto tempo, e que somente ele, o tempo, poderia acalmar essa dor.
Enquanto conversávamos, o filho chegou, acariciou a mãe e nos contou que em julho quando os pais completaram 71 anos de casados, ele ajudou o pai a se arrumar para a missa em comemoração ao casamento duradouro, assim que ficaram prontos ele e o pai, de 97 anos sentaram na sala para aguardar a mãe. Quando a senhora chegou, o marido assim disse:
-Nadir, sente-se aqui, perto de mim.
A senhora aproximou-se, sentou e segurou a mão do marido suavemente, foi quando então ele sorrindo perguntou para ela:
-Você ainda me ama?
Nesse instante, percebi o tamanho da perda daquela senhora. Depois de tanto tempo juntos, uma pergunta dessa. O amor mudou muito nos dias de hoje, mas o que ouvi me inspirou a compartilhar a história. Cabe apenas uma indagação: quantos de nós poderemos fazer a mesma pergunta sem temer a resposta?
Hoje estou mais calma. Nos últimos dias estive extremamente desconfortável. Uma quantidade de pensamentos estranhos me atormentaram. Acho que de certa forma, o dia de finados me afetou. Lembranças ruins vieram a tona. A morte que certeira levou meu pai há 12 anos atrás. Não que as pessoas não possam morrer, claro que isso faz parte da vida, mas penso sempre que se meu pai tivesse mudado o rumo de sua vida, quando eu tinha 10 anos, talvez ele tivesse sido feliz. O que me entristece é saber que ele não foi!
De uma certa forma o culpo pela falta de coragem. Naquela época o casamento deles tinha fracassado, eu vendo as minhas fotos de menina, sempre noto um ar de tristeza em meus olhos, os adultos não sabem, mas as crianças sentem e são atingidas pela relação ruim dos pais. Minha mãe era uma mulher bonita, mas incapaz de amar o meu pai. Ele adoeceu com o desamor.
Ao invés de terminar e começar de novo, ele ficou na mesmice de tentar o impossível, ser feliz com uma mulher que estava tão imersa no seu profundo egoísmo que era incapaz de percebê-lo ou as filhas, que cresciam sozinhas no profundo silêncio das palavras não ditas.
Hoje olho para ela e me ressinto, penso que ela foi tão infeliz a toa, nos fez sofrer tanto e ainda se atormenta dia a dia. Uma doença eterna: insatisfação! Insatisfeita com a casa, com o salário, com a empregada, com a síndica, com as filhas, enfim, com o mundo. Nada é bom o suficiente e jamais será! Às vezes me pego olhando para ela sentindo enorme pena!
Papai se foi, os anos se passaram, eu de certa forma, apesar dos traumas, sobrevivi. Ela continua agindo do mesmo jeito, afastando as pessoas cada vez mais. Concluí que ela é feliz sendo infeliz!
De uma coisa tenho certeza, se pudesse dar um conselho ao meu pai, eu diria: "Saia hoje de casa, reconstrua a sua vida, se apaixone novamente, me dê irmãos, quero ter um pai feliz!" Quem sabe, se ele assim o fizesse, em minhas fotos de infância, não estaria presente em meus olhinhos negros, aquela imensa tristeza...